terça-feira, 2 de abril de 2013

CHALANA GENIAL


CHALANA GENIAL


Há coisas que precisam de tempo para que lhes seja dado o valor que realmente merecem. É assim também no futebol, esse imenso mundo de imponderáveis. Aqui não existem certezas. Há pequenos desafios que caem por meros pormenores, batalhas gigantescas vencidas com atitude de gigante, objetivos que viram e reviram ao compasso de mil e um fatores, nem que seja uma bola na trave. Aqui há sobretudo convicção. Crença, no fundo. Acreditar num projeto e no trabalho. Acreditar na qualidade. Acreditar em nós. Até porque depois os segredos são poucos. Por detrás de um grande título está sempre uma grande equipa. E na génese de uma grande equipa está sempre um grande treinador. Invariavelmente. E hoje falamos de um grande treinador. Um treinador terceirense que o tempo se encarregou de valorizar, mas que há muito tempo se assumiu como isso mesmo: um grande treinador. Falamos de Manuel da Costa.
E é no tempo que recuamos. Da bancada de imprensa, habituamo-nos a ver com olhos de ver tudo o que acontece entre o computador e o relvado. Essa comunhão entre a paixão e uma simples bola, que mais não é do que futebol. E há jogos que ficam guardados, bem guardados, e que retiramos da gaveta da memória sempre que a memória nos faz recuar no tempo. O campo era o das Lajes. As equipas jovens, muito jovens. No Praiense despontavam Queirós e Moreira. O Operário saiu vergado por 5-0. No banco estava um senhor, Manuel da Costa, comandante de uma partida memorável.
Manda a contagem do tempo. Quase 10 anos depois, a Série Açores vem confirmar o que já estava mais do que confirmado. Fecha-se o pano sobre uma competição com honras de campeonato nacional e o Sport Club Praiense é o último campeão. Orquestra bem afinada pelo maestro Manuel da Costa, que ergue o seu primeiro título nacional enquanto técnico de uma equipa sénior. Precisamente na Praia da Vitória, berço de grande parte do seu percurso no reino do futebol terceirense.
Mas recuemos no tempo. Novamente. Manuel da Costa nasceu a 17 de agosto de 1965, nos Altares, mas foi nos Biscoitos que cresceu. O futebol surge aos 11 anos, nos "Magos da Bola", conjunto de alunos da Escola Vitorino Nemésio. E assim Manuel da Costa passa a ser, para todos e até aos dias de hoje, o Chalana. Esquerdino por natureza, comparavam-no ao "pequeno genial" do Benfica. Fez toda a carreira enquanto extremo, recuando até à lateral apenas nos últimos pontapés. Chega ao Praiense em 1977, onde fez toda a formação.
Estreia-se no escalão sénior ainda como júnior. Estávamos na época de 1983/84 e o Praiense, campeão de ilha e distrital, perde o acesso aos nacionais para o Águia dos Arrifes. A subida acontece na época seguinte, atuando na saudosa Série E da 3.ª Divisão Nacional até 1988, sempre pelos encarnados da Praia da Vitória. Em 1988/89 muda-se para os verdes do Lusitânia, onde ficou apenas uma temporada, saindo por motivos profissionais. Jogou um ano no Recreativo da Agualva, que competia nas provas de ilha. Regressa ao Praiense em 1990, mudando de camisola em 1993/94, desta feita para o Angrense, onde partilhou o balneário com Pedro Pauleta. De volta às origens em 1996/97, termina o seu percurso como jogador de futebol no Sport Club Praiense, mesmo que, em 2004/05, tenha contribuído para o título açoriano em futsal do Porto Martins enquanto atleta.
O curso de treinador surge de imediato e, em 1997/98, começa a trabalhar no Praiense, ao lado de José Carlos Santos. Seguem-se sete anos como adjunto de Celestino Ribeiro, sendo que, a partir de 2000/01, passou também a ser treinador da formação. É nos juniores A do Praiense que desponta: campeão regional por duas vezes, a segunda em 2004/05, vencendo todas as provas associativas. Depois de meia época no Lajense, enfrenta a primeira experiência como treinador principal do Praiense em 2005/06, com um 4.º lugar. Em 2007 chega ao Vilanovense, de onde saiu para o Lusitânia em 2008. O Estádio João Paulo II foi o palco da confirmação: um trabalho difícil, que começou com a descida da 2.ª divisão e terminou com um 3.º lugar no grupo da frente da Série Açores em 2010/11. Manuel da Costa soube moldar uma equipa em tempos turbulentos. Afirmou-se como grande treinador, mas também enquanto condutor de homens por excelência.
Homem simples, dedicado ao trabalho, conversar com Manuel da Costa é sempre um prazer. Sair das fronteiras da ilha e dar o salto é um desiderato que a sua profissão não faz passar de uma promessa. Talvez por isso nunca tenha atuado na 2.ª Divisão enquanto jogador. Na 2.ª Divisão vai estar o Praiense na próxima época, mas o mérito é dos jogadores. Chalana é assim, humilde. Fala apenas em orgulho e não esquece a família, quantas e quantas vezes sacrificada. Um sacrifício em nome de uma paixão: o futebol. É esta a vida de um grande treinador.

In, DI 31.03.2013

Sem comentários:

Enviar um comentário